quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Veja como é legal viajar de moto até Paraty


A Honda 300 XRE ficou "à vontade" nas ruas de pedras de cidade histórica de Paraty

— Tchau amor, vai com Deus!

Com a voz da minha esposa ainda ecoando no capacete subi na Honda XRE 300 com duas missões: conferir as condições da Estrada Parque Cunha-Paraty e entrevistar os aventureiros Ricardo e Daniel que foram até o Aconcágua, na Argentina. Até aí nada de mais, porém o curioso são as motos usadas na viagem: uma Shadow e uma Pop! Sou um caçador de histórias e gosto de gente que faz roteiros inusitados. Da minha casa, em Atibaia (SP), até Cunha (SP) tinha pela frente 250 quilômetros, mas daria uma esticada até Paraty, no litoral do Rio de Janeiro.

No trajeto vários tipos de estradas que seriam perfeitas para avaliar a nova XRE 300 ABS – que ganhou uma série de novidades na versão 2019, que eu ainda não havia experimentado. A nova geração vem dar uma chacoalhada na história da Honda XRE 300. A primeira geração foi lançada em 2009, sua produção começou em agosto daquele ano, já está em linha há 11 anos. Nesse período foram produzidas mais de 330 mil unidades do modelo.

Foram três abastecimentos e o consumo médio (de gasolina) ficou em 25 km/litro

— Quanto vai doutor?

Você se sente importante quando o frentista tê chama de doutor? Eu acho engraçado. Talvez seja pela imponência da XRE 300. Toda cinza fosco (quase preto), farol de LED, aquele paralama (tipo bico de pato) ajuda a encorpar o visual da moto. Ou ganhei o título de “doutor” por ser uma sexta-feira de manhã e a mala e o tripé (que uso para filmar) amarrados na bagagem denunciaram que meu destino era a estrada? Para a maioria das pessoas, todos que viajam de moto numa sexta estão curtindo, nem pensam que ele pode estar trabalhando – que era o meu caso.

— Completa com gasolina, por favor!

Embora a moto seja flex, eu prefiro gasolina que oferece maior autonomia. Enquanto pensava nas perguntas que faria para os aventureiros, o frentista alertou que o tanque encheu “até a boca” – capacidade para 13,8 litros de capacidade. O consumo médio da viagem foi de 25 km/litro com uma autonomia projetada de 340 quilômetros.

Peguei a Fernão Dias, com o guidão rumando para a luz do sol, vamos para o leste. Basta entrar na estrada que o motor da XRE 300, mostra seu entusiasmo. Com um cilindro (291,6 cc de capacidade), atinge 25,4 cavalos a 7.500 giros. Na prática significa que você tem “motor” para ultrapassar os caminhões sem muita preocupação com os carros.

Percorremos desde as rápidas auto-pistas até pacatas estradas no alto da serra de Cunha

Ela acelera de 80 a 120 km/h – pulando dos 5.000 para os 7.000 giros em pouco mais de 10 segundos. Sua velocidade de cruzeiro, que achei bem legal, é nos 110 km/h quando se anda junto com o fluxo, com o motor na marca dos 6.500 giros.

Bastam alguns quilômetros para piscar a seta para a direita e pegar a Rodovia D. Pedro I e ficar nessa estrada entediante até o final. Uma das poucas coisas legais da D. Pedro são as pontes sobre as represas. O céu azul e a água brilhando moldurada pelas montanhas deixam qualquer viajante feliz. Mantendo 120 km/h no velocímetro chego no primeiro pedágio e lá se vão R$ 4,75. Ainda teria pela frente pedágios na Ayton Senna e Dutra, sendo o mais caro de R$ 7,60 em Moreira Cesar (Norte), na Via Dutra.

Rapidão

Sempre tomo cuidado ao apoiar os pés nas paradas das cabines de pedágios. A chance de haver manchas de óleo é grande. Com a altura do banco de 86 cm, a XRE pede habilidade do piloto nessas condições, se o pé escorregar é chão na certa. Olho no retrovisor e não vem ninguém atrás. É o tempo de tirar a luva, entregar o dinheiro e pegar o troco o mais rápido possível. Não gosto de ficar parado nas cabines dos pedágios, infelizmente as colisões traseiras são comuns nesses lugares. Basta ver as marcas nas paredes e as vigas de proteção que as empresas instalam para proteger os caixas.

OK, o pedágio é chato (e caro) mas as estradas são verdadeiros tapetes. Ao deixar a D. Pedro entrei na Carvalho Pinto. Sempre com o sol na cara – rumando para o leste – em alguns trechos tirava tudo do motor da XRE. Se quisesse conseguiria superar os 140 km/h nas descidas enquanto nas subidas ela mantinha os 120 km/h sem reclamar. Enquanto o motor trabalha em quinta marcha na casa dos 6.500 giros, há como seria bom ter a sexta marcha nessa moto…

Novo modelo ganhou farol de LED e para lama "bico de pato", ficou mais imponente

Fui idiota

A medida que o sol fica mais alto no céu, a temperatura aumenta. Apesar de estar no meio do inverno, olho no relógio do painel para conferir as horas. Pouco mais de 10 horas e a jaqueta de cordura já está incomodando. Que inverno é esse? Os pneus Metzeler Enduro 3 literalmente “cantam” no asfalto quente da Ayrton Senna, enquanto divido a pistas com SUV´s descoladas e rápidas, alguns carros com a prancha amarrada no rack denunciam que estão em busca das ondas do litoral norte.

A postura na XRE permite viajar com as costas retas e a única coisa que incomoda é o equipamento de filmagem que transporto na mochila. Aqui vai um conselho: nunca se renda a tentação de carregar máquinas fotográficas, filmadoras e smartphones amarrados na bagagem da moto. A intensa oscilação danifica os frágeis componentes eletrônicos, aprendi isso da pior maneira – cheguei no local para fotografar e a máquina não funcionou. Além de perder a entrevista, passei por idiota (pra dizer a verdade, eu fui!).

Dutra, aqui vamos nós!

Em pouco tempo, a XRE entra na maior avenida do mundo, a Rodovia Presidente Dutra. É assim que eu chamo essa importante estrada que liga São Paulo ao Rio de Janeiro, sempre cheia de carros, caminhões, ciclistas, pedestres é uma verdadeira avenida passando por cidades importantes e movimentas. O intenso vai e vem pede atenção redobrada e as fechadas são comuns. Por vezes o motorista do caminhão não quer perder o embalo e invade a sua pista.

Na maioria das vezes é uma atitude previsível, basta perceber a velocidade do caminhão enquanto ele se aproxima do outro veiculo que está a sua frente. Lógico que ele não vai perder o embalo, por conta de uma moto que está chegando. Cabe ao piloto da moto ficar atento e reduzir a velocidade. Se for necessária uma frenagem mais forte, no caso da XRE os freios (disco de 256 mm na frente e, 220 mm (atrás), dão conta do recado. Se a frenagem for de emergência o sistema ABS, aquele que impede que as rodas travem, está lá para dar tranquilidade. Por sorte (e atenção) foram pouco utilizados na viagem.

Sistema de freio ABS evita o travamento das rodas nas frenagens de emergência

Vai na fé

Passei por Aparecida, fiz o sinal da cruz, e já me preparava para acessar a entrada para Cunha. É uma mudança interessante. Em apenas alguns momentos você deixa para trás a estrada mais movimentada do Brasil e entra num túnel do tempo. A pacata rodovia SP-171 liga Guaratinguetá a Cunha é uma daquelas estradas gostosas de pilotar. Ela passa por pequenas propriedades onde é possível ver que a vida segue mais calma. Porteiras velhas, Fuscas nas garagens e animais pastando calmamente são emoldurados pela viseira do capacete. Às margens da SP-171 o marco da Estrada Real – que servia para escoar a produção de ouro entre Minas e o porto, em Paraty.

É possível contornas as curvas enquanto o sistema de suspensão faz o seu trabalho, nos poucos desníveis ou pequenos buracos, a dianteira absorve facilmente graças ao garfo com 245 mm de curso – na traseira o sistema Pró-link (monoamortecedor) oferece 225 mm. Prá dizer a verdade, achava até um exagero usar uma on-off para esse percurso – mais lá na frente iria precisar (e muito) dessa suspensão, espera que já tê conto.

A única parada foi pertinho Cunha. Já tinha rodado mais de 200 km e as “partes baixas” começavam a se manifestar enquanto as pernas imploravam uma caminhada. Café com leite, pão de queijo, um quindim e a garrafa de água e pronto. Meu café-almoço no Tudo da Roça, que custou R$ 32, me permitia seguir até noite sem abastecer a barriga. Tinha muita coisa para fazer. Por R$ 90 me hospedei no Recando dos Pássaros. Atrás do chalé, o mugido dos bois parecia dizer “relaxa” você chegou nas montanhas de Cunha.

Banco largo e práticas alças para fixar bagagens são ideias para viagens

Lição de vida

Com calma preparei meu equipamento e fui para a entrevista com os aventureiros que moram em Cunha. Foram quase três horas de descobertas, boas histórias e uma visão diferente sobre a vida que o experiente Ricardo e seu filho Daniel me transmitiram. Parte dessa aventura está na edição 535 da Revista Duas Rodas e outra parte estará no meu Canal Trajetos e Destinos. Daniel é despojado de conforto e consegue viajar por um mês gastando apenas 200 dólares pedalando o dia inteiro e dormindo em lugares remotos. Enquanto ouvia e filmávamos, ainda tivemos a chance de experimentar um delicioso bolo de cenoura (feito pelo Daniel) e tomar um café. Em meio a “prosa” os sons das galinhas, cabrito e os cachorros marcavam presença no áudio da entrevista. Foi muito legal!!!

Enquanto o sol começava a se esconder era a hora de voltar para o chalé e testar a iluminação do farol com LED, uma das novidades da Honda XRE 300. Posso dizer que achei bem eficiente, naquela rodovia quase não passam carros e a estrada da pousada se resume a uma trilha larga no meio do mato. Graças ao facho branco foi fácil achar, até chegar no chalé é necessário descer um trecho de terra – enquanto o cão de guarda latia com vontade – atravessar a ponte de madeira e subir uma rampa bem íngreme. Aqui o torque do motor, 2,76 Kmg.f a 6.000 giros – foi um bom aliado. Só por a marcha certa que a moto sobe sem sustos e com muita confiança.


Tá com pressa? Esqueça

Feliz pelo resultado da entrevista, estava ansioso para abastecer a moto, conferir o consumo e descer até Paraty para fazer a segunda matéria da viagem. Dei um passeio na cidade em busca de uma boa janta. “Bati” aquele prato feito, com tudo que tinha direito: arroz, feijão, fritas, linguiça, farofa, cupim nossa, tanta coisa que mal cabia no prato que custou R$ 20. Mas valeu a pena. Dormi o sono dos justos, pensando na Estrada Parque, até Paraty…

Prendi a bolsa e o tripé usando uma aranha e um esticador fixados nos ganchos do bagageiro. Prá uma moto que se diz “aventureira”, lugares para fixar bagagens são essenciais e, na XRE, eles não faltam.



Deixando Cunha, em direção a Paraty, são quase 40 quilômetros de uma estrada fantástica. Ela sobe e desce e suas curvas, que eram abertas e poderiam ser feitas tranquilamente a 80 km/h, se tornam fechadas e pedem reduções de marchas. Elas serpenteiam as montanhas e beiram precipícios protegidos por guard-rails. Lembre-se, você deixa Cunha que está a 1.100 metros de altitude e vai para a praia, ao nível do mar. Para isso é preciso descer muito…

O sábado estava fantástico. A estrada, que estava vazia na sexta, recebeu muitos turistas e motociclistas exigindo um pouco mais de atenção. Ao chegar na divisa entre São Paulo Rio de Janeiro a Estrada Parque, que cruza o Parque Nacional da Bocaina, ganha o nome de RJ 165. Além do novo nome, a estrada cruza uma parte intocada da Mata Atlântica, recebeu pavimento de lajotas e permite contemplar a beleza da fauna e da flora do lugar. Em alguns lugares há passarelas para a travessia de macacos e outros animais selvagens. Além de curtir o visual, rodar devagar reduziu o consumo médio para 35 km/litro, uma surpresa legal!!!

Estrada Parque Cunha-Paraty, o melhor é curtir o visual e reduzir a velocidade, o visual compensa

Ao fim da estrada o turista se depara com um curioso farol na ponte de madeira que tem espaço para apenas um veículo, o farol controla o fluxo de quem sobe e desce. Apesar das obras de pavimentação, a estrada sofre com a queda de barreiras e é bem estreita, pedindo velocidade baixa e cuidado com galhos e folhas - que estão sempre no chão. A descida é feita em quase uma hora e a estrada passa pela periferia da Paray, muitos pedestres, turistas e cachorros exigem atenção constante. Lombadas, mal sinalizadas, vão dar alguns sustos em quem gosta de acelerar forte.

Há, mais um aviso, essa é uma estrada parque e seu uso não é recomendado a noite e podem haver barreiras policiais impedindo o acesso. O mais recomendado é usar a rodovia Oswaldo Cruz (SP-125), que liga Taubaté e Ubatuba.

Pedras lisas

Ao chegar em Paraty, pela estada Parque, fui tomado por uma certa nostalgia. Já havia passado por ela no começo dos anos 2.000 fazendo um comparativo entre a Yamaha Fazer 250 e a Honda CB 250 Twister – junto com o Arthur Caldeira, para a Revista Duas Rodas. Lembro das dificuldades em superar a lama e as pedras naquela descida desafiadora – mas era o único caminho entre Cunha e Paraty e muito usado pelos moradores, o que justificou nossa viagem-teste naquela época.

Paraty continua linda e recebendo muitos turistas. Boa parte dessa gente ansiosa e de sorriso aberto embarca no portinho da cidade para conhecer as ilhas na Baia de Paraty. Muitos deles se depararam com a minha Honda XRE que contrastava com os barcos coloridos que balançavam freneticamente ao sabor do vento. Precisava fazer uma foto e gravar o vídeo contando sobre a viagem.

Até chegar naquele local pus a prova a minha habilidade em enfrentar terrenos lisos. As pedras seculares de Paraty são polidas há muitos anos por rodas de carroças, patas de animais, pés humanos e rodas de automóveis. Pilotar em Paraty é legal para quem gosta de desafios. As mãos balançam enquanto a suspensão da moto faz o seu trabalho, subindo e descendo a cada pedra.


Além das pedras, a maré sempre sobe e alaga algumas ruas próxima ao porto, e foi numa dessas que agradeci por estar com a XRE 300E. Em determinado momento tinha que decidir entre voltar ou enfrentar a enchente. Como a altura mínima do solo da XRE é de 259 mm, bastou ficar em pé na pedaleira e manter a aceleração para superar a água. Mas confesso que fiquei com medo de cair. Lembre-se estava com todo o equipamento nas costas e tinha uma multidão de turistas olhando para aquela moto enfrentando a maré. Foram alguns segundos de travessia, mas tomei cuidado para equilibrar os 148 kg (a seco) da XRE e chegar no porto.

Feitas as fotos e a filmagem para o canal, subi na moto e voltei para Atibaia. Estava bastante feliz pela minha viagem de quase 700 quilômetros. A Honda XRE 300, que tem preço de R$ 19.147 (sem frete), se mostrou valente e uma ótima companheira de aventuras, as fotos e as imagens provam que nos divertimos bastante. Se você conhecer bem Paraty sugiro contratar um guia pela página do Facebook: clique aquiou pelo Whattsapp (24) 99907-7454, com a Sibele.

Nota da Redação: Esse material também foi publicado, em primeira mão, no Portal R7, no site MinutoMotor.